No futebol, desporto coletivo por excelência, o sucesso é um esforço conjunto dos vários intervenientes, sejam jogadores, treinadores, staff e até dos adeptos. Mas não há como negar que todos gostamos de indivíduos providenciais, capazes de elevar os que estão à sua volta acima das suas possibilidades, que tiram o melhor de si e dos outros, e na hora certa são decisivos. Brian Clough foi um desses indivíduos, mas hoje justiça será feita e também falarei do homem que tirou o melhor de Brian Clough, porque atrás de alguém grande, seja em que área for, tem de estar sempre alguém a dar aquele empurrão extra quando é preciso.
O Nottingham Forest teve o sucesso que teve entre 1977-80 não só por causa de Brian Clough, mas porque ao seu lado estava Peter Taylor, sendo que aquele autêntico “odd couple” foram um só no sucesso meteórico do clube durante aqueles anos. Juntos, desde que se conheceram na década de 50 no Middlesbrough, quando ambos ainda eram jogadores, rapidamente se tornaram um autêntico duo dinâmico, praticamente inseparáveis, apesar de terem sete anos de diferença.
Mas foi como treinadores que conheceram os seus maiores êxitos profissionais. Décadas depois, quando deixou de haver sintonia e deixaram de colaborar um com o outro (devido a vários desentendimentos) nunca mais nenhum deles bebeu do cálice da glória como fizeram primeiro no Derby County, onde construíram uma equipa que foi campeã de Inglaterra e chegou às meias finais da Taça dos Campeões (sendo eliminados de forma controversa pela Juventus), e depois no clube da cidade de Robin Hood, onde ganharam quase tudo o que havia para ganhar. Taylor morreu sem fazer as pazes com Clough, algo que este último lamentou amargamente até ao fim dos seus dias. Mas enquanto ambos funcionaram como equipa foram alquimistas que transformaram lata em ouro, autênticos escritores de contos de fadas.
É interessante constatar que apesar de tudo o que conquistaram tanto Clough como Taylor eram muitas vezes pouco ortodoxos nos métodos que empregavam, em contraste, por exemplo, com Don Revie, o grande némesis de Clough, que era extremamente metódico e organizado na preparação do jogo e no treino. Mas ambos tinham um jeito de lidar com pessoas que Revie e muitos outros treinadores não tinham.
Durante aqueles anos vitoriosos os jogadores eram muitas vezes motivados com pequenas festas bem regadas a álcool para criarem uma ligação entre todos, sendo que questões como falar na oposição e treinos técnico-tácticos eram reduzidas ao mínimo. Muitas vezes, a única tática era Clough dizer aos jogadores para passarem a bola a John Robertson, o “homem lento e gordo da ala esquerda”. Uma das provas da pouca ortodoxia da dupla é contada pelo defesa Larry Lloyd numa entrevista ao Daily Mail datada de 2008: antes de uma meia final em Amesterdão contra o Ajax os jogadores e staff foram ao red light district da cidade. “Peter Taylor tentou negociar um desconto de primeira vez para Viv Anderson, que era o mais novo da equipa. Anderson ficou bastante embaraçado”.
Quanto ao treino, Lloyd afirma: “Nunca fomos treinados no verdadeiro sentido da palavra. (…) De facto pouco treinávamos. (…) O segredo, creio, estava em Peter Taylor que com ele (Clough) construíu uma equipa que sabia o que fazer. Ele nunca pedia coisas que não conseguíamos fazer, e mais importante, ajudou-nos a jogar sem medo”. Contudo, ao contrário de Clough, Lloyd discutia a oposição com Kenny Burns, defesa central como ele, e juntos formaram uma muralha que muitas vezes era intransponível. E na baliza, caso os adversários passassem por eles, estava um monstro chamado Peter Shilton.
A história tende a lembrar-se mais de Clough do que de Taylor, por o primeiro ter tido uma persona pública mais ubíqua, ao contrário do segundo, que era uma pessoa mais recatada. Mas juntos foram das melhores duplas da história do futebol, duas partes de um todo. Ambos são idolatrados tanto em Derby como em Nottingham, uma das poucas coisas em que as massas adeptas dos dois clubes rivais concordam. Tanto o Derby como o Nottingham, dois clubes relativamente obscuros durante grande parte das suas histórias, saíram da mediocridade e tocaram o Olimpo com eles os dois.
Como disse Clough: “I am the shop front, he is the goods in the back”, qualquer coisa como “eu sou a frente da loja, ele é os bens que estão nas traseiras”. Lisonjeiro, à boa maneira de Cloughie.
Mas que a História seja justa também com Taylor. Ele merece.
*Autor da Página “Vida de Adepto”