A vida é ingrata…
Um último pontapé livre, no sétimo minuto do tempo de descontos O pé esquerdo de Christian Atsu bate na bola para levar à loucura o Estádio Yeni Hatay na partida contra o Kasımpaşa, garantindo um saboroso e, já, inesperado triunfo. Naquele momento, Atsu tornava-se o herói das bancadas ao tirar o Hatayspor da zona de despromoção.
No entanto, os sorrisos e a euforia haveriam de dar lugar a imensa tristeza nas fileiras de Volkan Demirel. Aquele momento de inigualável gratificação será infelizmente recordado como o último do extremo ganês. Na noite seguinte, um terrível terramoto de magnitude 7,8 atingiria o sul da Turquia. Após quase duas semanas de esperança e preocupação, o jogador, que tinha feito 31 anos em Janeiro, foi encontrado morto hoje.
Falemos de uma vida de superação e de busca do melhor para si, mas para todos o que o rodeavam. O atacante abandonou o seu país aos 17 anos para viver o sonho europeu no FC Porto. Seria emprestado ao Rio Ave para regressar aos Dragões, com quem ganhou o campeonato em 2013. O ganês, depois de recusar renovar o vínculo contratual com a equipa portuguesa, assinou então com o Chelsea por cinco anos, mas o passo seguinte passaria por cumprir o contrato em outros clubes.
Com efeito, nunca teve a sua oportunidade com os Blues, sendo emprestado ao Vitesse Arnhem, ao Everton, Bournemouth e Málaga. Em 2016-2017, regressou a Newcastle, sob o comando de Rafael Benitez, e ajudou os Magpies a regressar à Premier League com os seus cinco golos no Championship. Jogou 75 jogos da Premier League durante as três temporadas seguintes. Jogou 60 vezes pela selecção do Gana, no Campeonato do Mundo de 2014 e chegou à final da Taça de África de 2015, que perdeu no desempate por penaltys. Um torneio no qual Atsu foi eleito o melhor jogador.
” – Tivemos muito pouco, mas ficámos felizes. Para todos no Gana, cada dia é uma luta. Mas eu tinha os meus pais à minha volta”, costumava dizer.
Como embaixador do Arms Around The Child, iniciou a construção de uma escola na aldeia de Senya Beraku. Com o trabalho quase concluído, deveria regressar em Junho para a abertura do estabelecimento de ensino. Atsu também costumava visitar um orfanato para brincar com as crianças e levar comida, papel higiénico ou livros. “Demasiadas pessoas negligenciaram estas crianças. Demasiadas pessoas afastaram-nas. Eu quero dar-lhes comida, educação. Mas acima de tudo, quero fazê-las sorrir”, explicava ao jornal The League Paper em 2016. “Muita gente no Gana vive em extrema dificuldade, e eu quero trazer-lhes alguma felicidade. Quero dar a estas crianças esperança de um futuro melhor, porque foi isso que os meus pais me deram”.
Atsu não teve uma infância fácil com os seus seis irmãos e quatro irmãs. “Com os meus dois pais, éramos treze. ”
A sua irmã gémea Christina e o seu irmão mais velho Isaac estavam na Turquia há vários dias, na esperança de o encontrar. Há algumas horas, a Federação de Futebol do Gana tinha emitido uma declaração apelando a um resultado positivo: “Estes são dias de tortura emocional, busca e dor (…), mas ainda estamos optimistas. Instamos o seu clube e as autoridades turcas a não abandonarem a busca e a acelerarem os esforços de salvamento do nosso irmão Christian Atsu. Continuamos positivos e pedimos ao povo ganês que reze por Atsu neste momento difícil“.
Infelizmente, não o voltarão a ver neste mundo, deixando a sua esposa Marie-Claire e os seus três filhos num luto interminável. O céu tem agora mais uma estrela como nenhuma outra: uma Estrela Negra que ninguém vai esquecer. Que descanse em paz…